Em outubro do ano passado, tivemos a notícia que 76% dos portugueses são favoráveis à ideia de um Rendimento Básico Incondicional (RBI). Um RBI é, no essencial, um rendimento extra, mas destaca-se pela sua singularidade. O RBI, enquanto proposta, visa atribuir a todos os cidadãos, de uma determinada comunidade, um rendimento individual, livre de obrigações, que lhes permita viver com mais liberdade e concretizar projetos de vida com maior segurança. Significaria, por isso, que todos os portugueses receberiam o mesmo valor, durante a sua vida, independentemente do seu rendimento ou da sua ocupação. Qualquer pessoa receberia o valor quer esteja a trabalhar, desempregado, a estudar ou mesmo se estiver reformado.
A ideia não é nova, mas a pandemia de Covid-19 e os seus efeitos perniciosos têm realçado a importância de repensar os mecanismos de assistência social de forma a torná-los mais eficazes e mais robustos.
Podemos perguntar-nos porque pode ser a ideia do RBI superior a outros mecanismos, como, por exemplo, os serviços básicos para todos, nos quais toda a população tem acesso aos serviços como saúde, educação, habitação, alimentação, entre outros. Ou a ideia do Rendimento Social de Inserção, que já existe em Portugal. Ou talvez ainda da ideia do Estado como Empregador de Último Recurso, atribuindo ao Estado a responsabilidade de criar empregos para todos em períodos de crise económica.
Por um lado, o RBI não é paternalista. Ao contrário da ideia dos Serviços Universais, quando estendida ao acesso à alimentação, ou roupa, por exemplo, o RBI não pretende determinar o que devem as pessoas comer ou vestir. Ao apoiarmos a ideia do RBI estamos coletivamente, como sociedade, a confiar que cada um de nós, na maioria da nossa vida, deveria poder fazer as suas próprias escolhas.
Por outro lado, o RBI não é estigmatizante. Ao contrário da ideia do Rendimento Social de Inserção não precisa que as pessoas façam prova da sua situação de pobreza ou de destituição. Ao promovermos a ideia do RBI, consideramos que todos nós, em algum momento da vida, podemos estar sujeitos a situações de pobreza e não deveríamos ser estigmatizados por isso. Acreditamos que é nossa responsabilidade coletiva garantir que ninguém sofre numa situação de pobreza.
Finalmente, o RBI acredita que existe mais vida para além do trabalho assalariado – o que chamamos de emprego. Ao contrário da visão do Estado como Empregador de Último Recurso, não acha que a única forma de contribuir na sociedade é através do emprego. É preciso entender-se que quem cuida dos seus filhos ou faz voluntariado regularmente também está a contribuir. É preciso garantir que a nossa sobrevivência não depende apenas de uma atividade economicamente produtiva.
Na proposta que defendo, o RBI deve ser implementado para complementar o ramo de assistência social do Estado e assegurar um apoio mais robusto e eficaz. Todos receberão apoio, incluindo os trabalhadores precários, que muitas vezes não possuem qualquer rede de segurança, mas também os trabalhadores pobres ou os desempregados. Neste sentido, o RBI não substitui apoios existentes, ainda que alguns se possam potencialmente tornar redundantes (Rendimento Social de Inserção). Serviços básicos, como o Serviço Nacional de Saúde ou o Sistema Público de Educação, continuariam a existir.
É por isso que está a decorrer uma Iniciativa Europeia pela Implementação do Rendimento Básico Incondicional. A iniciativa pretende angariar um milhão de assinaturas de cidadãos europeus, para pressionar a Comissão Europeia e o Parlamento Europeu a considerarem a ideia do Rendimento Básico Incondicional. É importante a assinatura de todos os que acreditam que novos desafios exigem novas soluções. E pensar o RBI não implica implementá-lo na sua versão mais teórica imediatamente. Implica, antes, adotar uma postura crítica face à forma como olhamos para a nossa relação com o que todos os dias chamamos de trabalho.
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